SÃO PAULO | TEIXEIRA DE PASCOAES

O título que vos apresento para leitura de verão pode não ser o mais convidativo de todo. E eu compreendo: “era o que faltava estar a ler coisas religiosas no verão”, estarão a pensar, enquanto seguram um gin tónico.

Colocando toda a minha fé neste livro, vou arriscar fazer a sugestão da sua leitura, que vos poderá lançar numa viagem espiritual intensa ou, pelo contrário, numa violenta repulsa. Aqui é o tudo ou nada. E afinal que importam os livros que não nos deixam impressão, reação visceral?

Foi no coração da serra do Marão, em Gatão, que Pascoaes ardeu no fogo do espírito criador, para oferecer uma obra poética ímpar no panorama literário português. É difícil de classificar Pascoaes: ele é o Poeta.

É também difícil de classificar S. Paulo. Não é uma biografia no sentido original do género sobre o Santo. É mais qualquer coisa. Quem sabe se o biografado não é o próprio Pascoaes, numa transmutação da alquimia das palavras. Não é uma obra teológica na medida em que não se fixa na exegese cristã, quando muito, podemos dizer que existe como que uma teologia do pensamento religioso de Pascoaes sintetizada na obra, que na altura provocou celeuma entre os padres portugueses.

Neste livro escrito em prosa, mas que contem nele mais poesia, Pascoaes rasga as possibilidades do pensamento, estica e revolve os significados mais profundos das palavras, para tocar no inefável, no inaudito, enfim, nesse Deus nascido do pecado e do silêncio.

Carlos Barradas, coordenador do Centro Local de Aprendizagem da Madeira, agosto 2022